Através da memória de Jacob, somos levados de volta ao verão de 1931, quando, aos 23 anos, ele viu sua vida mudar completamente. Com a morte dos pais, vítimas de um acidente de carro, Jacob passa de um estudante universitário prestes a se formar como veterinário e com um futuro já planejado, a condição de órfão, desprovido de herança e sem lugar para ir. Desnorteado, o rapaz foge durante os exames finais e anda sem rumo pela mata, acompanhando a linha férrea, até deparar-se com um trem em movimento no qual embarca. Para sua surpresa, ele não havia embarcado em qualquer trem, mas estava a bordo do Circo Irmãos Benzini – O Maior Espetáculo da Terra. A partir do embarque de Jacob, a autora Sara Gruen nos leva ao maravilhoso e assustador mundo do circo. Um lugar onde adultos e crianças buscam alegria e diversão, mas que esconde em seus bastidores as duras histórias de vida daqueles responsáveis por manter a magia do picadeiro. Do trabalho extenuante de montagem das tendas à hierarquia que separa os trabalhadores, artistas e chefes e a consequente distribuição desigual de privilégios, somos apresentados a um mundo completamente diferente daquilo que o público vê.
Comandado pelo ganancioso tio Al, o Circo dos Irmãos Benzini é um espetáculo que sobrevive sob suas próprias leis. Trabalhadores braçais e animais são vítimas de exploração e maus tratos em um cenário que se agrava à medida que a situação financeira do mesmo piora, em parte pelo período da Grande Depressão Americana em que a narrativa se insere, mas principalmente pela péssima administração dos responsáveis.
Aceito graças à Universidade de renome que frequentava, Jacob se vê dividido entre o mundo dos trabalhadores e artistas, sem pertencer exatamente a nenhum dos dois. É nessa situação de incerteza que será introduzido àquelas que se tornarão os dois amores de sua vida: Marlena, a estrela do circo e casada com o desequilibrado August; e Rosie, uma elefanta comilona e aparentemente burra que Jacob treina e protege de maneira a torná-la o novo grande número do picadeiro.
No livro “Água Para Elefantes”, Sara se utiliza de uma ampla pesquisa e anedotas comuns na realidade circense para dar vida à narrativa. As crueldades infringidas aos trabalhadores, as peripécias e castigos relacionados aos animais estão em questão. Conhecida por retratar a vida animal em seus livros, a própria autora admite ter tido a intenção de demonstrar o tratamento dispensado aos elefantes durante aquele período histórico.
O resultado de tudo é uma história cativante que se utiliza de uma linguagem clara, até mesmo bruta em alguns momentos, para descrever a vida sob a grande tenda, não deixando que seja omitido um detalhe sequer. Os espetáculos na tenda principal; os que acontecem na tenda secundária; as festas glamorosas nos vagões dos artistas; as farras e bebedeiras dos empregados, bem como suas conseqüências. A narrativa tem, inclusive, um número razoável de reviravoltas que consegue manter o leitor interessado até o final.
Outro aspecto positivo é que o livro consegue abordar o romance entre Jacob e Marlena sem parecer exagerado ou mesmo piegas. O desenvolvimento da relação dos dois é descrita de maneira convincente e sem muitos floreios, jamais ganhando mais espaço do que o necessário.
A parte mais emocional da narrativa, porém, são os momentos em que somos trazidos de volta a realidade e novamente nos encontramos na companhia do idoso Jacob Jankowski. Difícil não se identificar com a nostalgia com a qual ele se lembra daquele que foi o período que definiu o resto de sua vida, assim como a maneira como ele tenta desesperadamente afastar-se do rótulo lhe conferido pela idade avançada e se apegar desesperadamente aos pequenos detalhes que fazem dele simplesmente um ser humano que viveu mais do que a maioria dos outros.
Nesse romance que cativa da primeira até a última folha, Sara Gruen transformou não apenas o circo, mas a vida, através das lembranças de Jacob, no maior espetáculo da Terra.
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